quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Eu sou neguinha!

“Nascer negro é consequência.
Ser é consciência”.

Sergio Vaz, poeta.

Novembro termina sob ameças de ser pintado de azul, mas o novembro será sempre Negro apesar de Zumbi ser homem... Os homens que se cuidem, porque os negros nunca desistiram de lutar.

Vocês sabiam que sou negra? Não me lembro de ter falado sobre isso antes mas, pra quem ainda não sabe, "eu sou neguinha"! Não falo porque não acho que cor de pele seja algo relevante quando o assunto é gente. Gente é bom de toda cor e se fosse colorido seria melhor ainda, eu mesma queria ser vermelha com listrinhas amarelas e manchinhas verdes, mas nasci assim, com pouca melanina e muita adrenalina.

Frequentemente me dizem:
- Você não é negra, menina! É tão branquinha...
- Dá licença.

Ninguém vai me dizer o que sou. Eu sou o que sinto e ponto.
Acho um desperdício essa mania que algumas pessoas tem de ficar definindo o que pode e não pode. Para mim, isso é racismo velado.

Sou negra e sempre me corrigiram afirmando que, no máximo, sou "parda" (num sei nem o que é isso...) por conta do meu tom de pele. Sinto muito pela ignorância alheia, mas qualquer racista, facista, nazista ou "oculista" que olhe pra mim vai discordar automaticamente do que afirmam minhas compatriotas. Sou negra e faço questão de me afirmar enquanto NEGRA.

Sinto e lamento em saber que vou sentir a vida inteira o peso do racismo. Só eu sei quantas 'portas de emprego" se fecharam para, em seguidas, terem contratos assinados com loirinhas de cabelo liso (chapinha? pouco importa). Lembro com tristeza das famílias dos namorados brancos que tive fazendo cara feia quando eu chegava e dos comentários que "sem querer" eu ouvi. Do meu marido falando que eu "ficava melhor" com cabelo liso. Lembro de tantas coisas que preferia esquecer e que se não fosse a ancestralidade de meu povo, garantindo dentro de mim a força necessária, eu não teria conseguido. Um toque de afoxé certa noite me mostrou o que faltava para continuar, pra me sentir bonita, para ter coragem de encarar o mundo, sendo como sou: a consciência de ser uma mulher negra.

As pessoas costumam confundir alhos com bugalhos.

Estátuas brancas de Iemanjá são uma afronta, mas uma branca de turbante, não. Dizer que esta ou aquela está se "apropriando da identidade negra" é excesso e um certo racismo. Não é possível se apropriar da identidade negra, isso é sentido, vivido, é doloroso e majestoso. Está no sangue. Não podemos dizer o que as pessoas brancas podem ou não podem usar, oxalá pudéssemos todas nós nos vestir como bem entendemos sem discriminação. Não preciso da tolerância de ninguém, só quero o que é meu, minha liberdade. É minha, terei de volta.

Queria que todas e todos pudessem usar o cabelo que acham bonito, usar a roupa que querem, enfim, ser quem são, sem a mídia ou as intelectuais pra dizer o que é certo ou errado.

Sou importunada pelos negros cotidianamente por ter um tom claro na pele, discriminada desde a infância pelos brancos por ter os traços dos negros…. Sinceramente, eu quero mesmo é que me deixem em paz!

Sou negra porque quero ser, me olhei no espelho e percebi o óbvio, aquilo que os negros racistas teimam em não querer ver, aqueles mesmos que questionavam a "negritude" de Bob Marley. Eu escolhi ser negra, mesmo já sendo.

Sinto dentro de mim a ancestralidade do meu povo e ninguém vai me definir, eu não preciso. Uso turbante e cabelo crespo porque sou bonita assim, pinto meus "beiços" e vou pro afoxé, ergo meu punho de pele clara e vou pra rua, para o enfrentamento com quem não aceita o diferente. Quem vai me impedir? sou o que quero ser e tenho orgulho.Apesar de tudo minha pele ainda é "clara", mas afinal qual é mesmo a importância da cor da pele de um ser humano se todos temos sangue vermelho? Como diria o irmão Martin “I have a dream…”



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